sábado, 2 de abril de 2011

PS Quietude: bastidores de uma dura rotina

Profissionais revelam o cotidiano de alegrias, tristezas e até violência na unidade
 
 
Programas americanos têm inspirado emissoras brasileiras a mostrar os bastidores de serviços como abordagens policiais e resgates de acidentados. Cenas fortes e até inusitadas chamam a atenção do público para o quase desconhecido trabalho de profissionais, que diariamente arriscam suas vidas em prol de outras. Se fosse possível gravar o que há por trás do atendimento de um pronto-socorro, as imagens igualmente chocariam o telespectador.

O Pronto-Socorro do Bairro Quietude, em Praia Grande, seria um desses locais que renderia episódios extraordinários, conforme relatos protagonizados por funcionários que atuam na unidade. Pelo local chegam a circular, em um dia, quase mil pessoas em busca de atendimentos diversos, desde pacientes com ligeiro mal-estar a vítimas de armas de fogo e acidentes automobilísticos.

Taís Gago Jordão, médica responsável pelo PS Quietude, mencionou fatos que marcaram sua vida, desde que assumiu o cargo, um ano atrás. Tranquila, revelou já ter sido desrespeitada e agredida verbalmente, mas disse saber lidar com o problema. Entre boas e más lembranças, destacou momentos em que participou da dor de pessoas que perderam parentes e da alegria de quem celebrou a vida.

Uma das ocasiões que a emocionaram foi a reação de uma mãe cujo filho pequeno havia chegado à unidade em estado grave e não resistiu. “Foi muito triste ver a mãe ajoelhada, perguntado a Deus o que ela havia feito de errado para merecer aquilo. Para nós, é muito comovente ver que todo nosso empenho não foi suficiente para salvar a vida de uma pessoa, especialmente quando se trata de uma criança. Tenho um filho de seis anos e imagino como deve se sentir uma mãe nessas condições”, disse.

Mas o tumultuado cotidiano do PS também já proporcionou momentos de felicidade, como o caso de uma jovem que teve uma parada respiratória após receber um medicamento do qual era alérgica. “Ela não sabia que não podia tomar a medicação. Ao socorrê-la, providenciamos a reanimação e depois a entubação. No dia seguinte, ela recebeu alta e apareceu no PS para agradecer”, contou Taís.

Mas a indignação de alguns para com os problemas de superlotação e demora no atendimento não permitem que todos reconheçam as qualidades dos profissionais de saúde que atuam no pronto-socorro. Para Taís, os trabalhadores que lidam com essa dura realidade não podem esperar gratidão dos pacientes. “Temos que cumprir nossa obrigação e sermos profissionais. Esse é o nosso dever”, afirmou.

Bebê - A alegria voltou a invadir a unidade em um dia em que uma mulher deu à luz ao chegar ao posto médico e foi socorrida imediatamente. Segundo a auxiliar de supervisão, Marizilda Aparecida de Souza, um homem pediu ajuda no setor de emergência. “A auxiliar de enfermagem apanhou o bebê no momento em que ele nascia, no banco do automóvel, evitando que caísse no chão. A criança veio ao mundo plenamente saudável”, lembrou.

Outro caso que abalou os profissionais se deu quando um menino chegou com o abdome aberto por um acidente doméstico. De acordo com a supervisora do PS Quietude, Ledinéia dos Santos Fernandes, a mãe chegara ao local apenas com uma toalha cobrindo o ferimento. “Era possível ver os orgãos internos da criança, o que a expunha ao sério risco de morte. Quando vimos aquilo ficamos estupefatos. Felizmente, o pronto atendimento com uma sutura resolveu o problema e o garoto sobreviveu”, narrou.

Agressão - E quando a revolta dos que esperam por um atendimento rápido e satisfatório resulta em violência? A supervisora Ledinéia disse ter presenciado uma cena assim, quando um paciente agrediu um médico a socos, quebrando-lhe nariz e clavícula. “Tudo isso por causa de um atestado. Às segundas-feiras, a unidade costuma ficar lotada de gente doente e quando não é um caso para atestado médico, as pessoas ficam revoltadas”, revelou.

A demanda por casos corriqueiros são os que mais movimentam o pronto-socorro. Na opinião da enfermeira-chefe da unidade, Livia Canelas Sciarpa, boa parte dos problemas poderiam ser resolvidos em ambulatórios. “Os casos de pessoas com diabetes e hipertensão são os mais comuns. Muitos deveriam tomar medicação e não tomam. Quando abusam e seus problemas se agravam, procuram o pronto-socorro e acabam gerando uma lotação na unidade”, pontua.

Além de tudo isso, médicos, enfermeiros, auxiliares de enfermagem, atendentes e todos os outros trabalhadores levam a pecha de maus prestadores de serviço à população. Ainda assim, esses anônimos profissionais, heróis para alguns e vilões para outros, continuam desempenhando a árdua função de cuidar da saúde e bem-estar daqueles que, todos os dias, buscam socorro para suas enfermidades, sejam elas simples conjuntivites ou delicadas lesões.

O Pronto-Socorro Quietude funciona na Avenida Ministro Marcos Freire, s/n, no bairro que dá nome à unidade.

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